O LENTO ADEUS A CORTIÇA

Interessante matéria de Reinaldo Paes Barreto, no site www.enoeventos.com.br

Até o início do século 18, os bebedores de vinho não dispunham nem da rolha, nem da garrafa atuais. O vinho era retirado dos tonéis logo após a fermentação e colocado em odres, ou ânforas, as quais eram vedadas precariamente com tampões de linho, ou estopas, embebidos em linhaça, e ali permanecia o menor tempo possível, isto é, até ser colocado em pequenas jarras e transportado à taça dos convidados - que o bebiam, portanto, ainda jovem.

A descoberta da rolha de cortiça e da garrafa foram, por conseguinte, as maiores conquistas enológicas de todos os tempos!

A rolha de cortiça é retirada da casca do sobreiro – quercus suber - árvore de crescimento demorado (30 anos), encontrada basicamente em Portugal, na Espanha e na Grécia, e só a partir de 1700 passou a ser amarrada por barbantes às garrafas. Nessa época, era formada de cubos maciços de cortiça com arestas aparadas; só em 1820 surgiu o primeiro dispositivo para produzir rolhas cilíndricas. Ainda hoje, a sua vida útil varia em média de 20 a 50 anos.

Antes de ser colocada no topo do gargalo, a rolha deve ser esterilizada de forma padronizada e científica. A incorreta esterilização pode introduzir nas garrafas resíduos de cloro, fenóis, umidade e mofo (conhecido como TCA), que provoca o “gosto de rolha velha” - bouchonné.

As outras duas modalidades de vedação são a rolha sintética e a tampa de rosca, ou screw-cap.

A rolha sintética é, hoje, uma realidade no mundo do vinho. A Nomacorc, por exemplo, está se unindo à Universidade Católica do Chile, para iniciar um estudo visando melhorar a qualidade dos vinhos, isto é, dosando a entrada de oxigênio para estimular seus aromas e evolução. A rolha sintética é utilizada largamente no mundo, às vezes pura, outras vezes como "miolo" da de cortiça.

Agora, a polêmica screw-cap. Os primeiros produtores a utilizá-la foram os da Nova Zelândia e da Austrália, desde o final dos anos 90. Hoje, até a França aderiu – eles lá chamam de stelvin – e, atualmente, há bons rótulos de borgonhas e bordeaux no mercado com esse tipo de vedação. É como uma tampa de refrigerante, revestida de um material que pode ficar em contato com o vinho. Suas vantagens são as de apresentar 0% de risco de contaminação aromática, poder ser tirada e recolocada na garrafa, além de ser altamente indicada para vinhos que não necessitam da presença do oxigênio para melhorar.

"É melhor uma tampa de rosca do que uma rolha ruim", diz Paulo Nicolay, enólogo que assina as cartas de vinhos de vários restaurantes cariocas.Dionísio Chaves, sommelier premiado e responsável pela carta e serviço de vinhos do Fasano-Rio, concorda: "Acho que a tampa de rosca é a única saída para vinhos jovens. Com a quantidade de vinhos que estão sendo engarrafados no mundo, não há cortiça que dê conta. Só vai ter rolha boa para vinhos de grande guarda. E, mesmo para esses "longevos", os produtores da screw-captêm a resposta: já são produzidas tampas com diferentes materiais, de acordo com o "perfil do vinho". Ou seja: tampas com micro-orifícios, para vinhos a serem consumidos em até 10 anos."

Moral da história:

A rolha de cortiça tem todo o charme de ser algo antigo, tradicional, faz parte do imaginário de uma garrafa de vinho. Por outro lado, o custo da matéria-prima mais o processamento é alto e às vezes chega a custar entre 25 e 50 cents de euro, podendo chegar a 1 euro - mais do que o preço de custo de um litro de alguns vinhos.

As rolhas sintéticas são mais em conta e barateiam o custo de produção do vinho, mas não têm o charme e a tradição das rolhas de cortiça, nem a aparência de modernidade das de metal.

As screw-cap são as mais baratas de todas, custando no máximo 25 cents de euro. E a maioria já apresenta micro-furos que permitem a passagem de ar. Vinhos australianos, neo-zelandeses, franceses, americanos e alguns chilenos e argentinos já estão adotando este novo formato.

Provocação: já pensaram num Petrus, ou um Barbaresco, ou um Opus Onecom screw-cap? É difícil, mas é bom deixar a emoção de lado, porque a vida é a arte do possível e qualquer dia vão embelezar tanto o design da screw-cap, - com nano-reproduções de Portinari, Di, Fukuda, etc... - que não sei não... O consolo é que o bom, mesmo, é o vinho: a gente não bebe nem a garrafa nem a tampa! Saúde.

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